Terça-feira, 30 de Junho de 2009
“Para os astrónomos, o facto da velocidade de rotação da matéria em torno do centro galáctico ser constante é um grande mistério, não é verdade Mário?”
“Um mistério sim... mas resolvido, isso é uma evidência da existência da Matéria Negra, como muito bem sabes!”
“Curiosa evidência... e logo a Matéria Negra tinha de ser na exacta quantidade e na exacta distribuição capaz de assegurar a constância da velocidade de rotação...”
Mário impacientou-se. Pensei que iria dar a resposta que os cientistas costumam dar quando são confrontados com estas coisas mas enganei-me:
“Estou à espera da tua explicação. As explicações não são boas nem más, são apenas melhores ou piores. Espero sinceramente que apresentes uma explicação melhor.”
“Há dois grandes erros nos actuais raciocínios em relação à formação das galáxias. Um, é presumir que uma galáxia tem semelhanças com um sistema planetário, onde a velocidade dos planetas diminui com a distância à estrela.”
“E não tem??? Não resultam ambos da condensação de uma nuvem de matéria? Apenas a dimensão é diferente, o fenómeno físico é o mesmo!”
“É exactamente aí que está o erro: o fenómeno físico não é o mesmo, é até muito diferente. Um sistema planetário não resulta da condensação de uma nuvem de matéria.”
“Que estás tu para aí a dizer? Isso é assunto mais do que esclarecido!”
“Mário, o resultado final da condensação de uma nuvem são as estrelas; a ideia de que poderiam ficar para trás uns minúsculos corpos a que chamamos planetas nunca foi confirmada pelas inúmeras emulações numéricas, como saberás.”
“Sim, por enquanto, mas será só uma questão de tempo e de aperfeiçoamento do modelo. Só pode ser dessa maneira que se formaram os planetas porque já se provou que todas as alternativas são falsas.”
“Todas as alternativas de que os cientistas se lembraram, Mário! Só não se lembraram da alternativa certa; além de que não há semelhança nenhuma entre esses minúsculos corpos que são os planetas e a distribuição de matéria numa galáxia. Essa presunção, que é o suporte principal da ideia da Matéria Negra, é um absurdo, como veremos.”
“Claro, só tens é de me mostrar que as órbitas das estrelas não obedecem às leis que regem as dos planetas. E qual é o outro suposto erro?”
“ O do costume... para entendermos qualquer coisa temos de conseguir traçar a história dos acontecimentos que conduziram a ela. Tal como uma alavanca precisa de um ponto de apoio, também precisamos de conhecer um estado anterior.”
“Sim, isso é lógico, qual é o problema?”
“Quando não se conhece o estado anterior, a nossa tendência é presumir que este foi um estado de grande confusão, caótico, a partir do qual todas as coisas se tornam possíveis. Mas não é assim que as coisas acontecem neste Universo. É bem ao contrário. Os estados, em escalas suficientemente grandes, sucedem-se de uma forma clara e determinística.”
“E então?”
“As explosões, tipo Big Bang, ou as catástrofes, tipo meteoro que choca com a Terra, ou os outros processos caóticos, tipo colapso de nuvens de matéria para gerar sistemas planetários ou galáxias, são suposições muito cómodas porque a partir delas se pode concluir qualquer coisa, mas disparatadas, pontos de apoio fictícios que alavancam o nosso desconhecimento.”
“Oh Jorge, entraste agora na Filosofia? Estamos à espera que expliques as galáxias, já te esqueceste?”
“Isto é para esclarecer o seguinte: eu não presumo esses estados anteriores que permitem alavancar uma explicação porque já sei que conduzem a explicações erradas, baseio-me apenas no que consegui identificar dos estados anteriores. A consequência é que apenas posso ir descobrindo aspectos parciais dos fenómenos, em função dos aspectos parciais dos estados anteriores que vou percebendo. É o que eu chamo ir descobrindo peças do puzzle. Neste caso das galáxias, tenho algumas peças do puzzle mas não tenho todas. E faltam-me dados sobre a disposição espacial das galáxias para poder testar essas peças.”
“Hummm, já estás a «fugir com o rabo à seringa»! Mário riu-se, mais simpático do que trocista.
“Nós já conhecemos um estado anterior às galáxias, que é o anel de intersecção das bolhas, e é por aí que vamos começar, caracterizando bem os campos de forças e o movimento da matéria no processo de crescimento do anel. Esta é a nossa vantagem em relação aos astrónomos, pois eles não descobriram esse processo e presumem que a matéria se vai condensando apenas em consequência da atracção gravítica entre partículas.”
Terça-feira, 16 de Junho de 2009

Rotation curve of a typical spiral galaxy: predicted (A) and observed (B). The discrepancy between the curves is attributed to dark matter.
... antes de dizer, dez vezes hei-de saber... a minha velha máxima estoira-me na cabeça, sinal de aviso, vou fazer o quê, apresentar ideias pouco consolidadas sobre este processo diverso e complexo da formação das galáxias?
“Então, adormeceste? Olha que a noite ainda é uma criança!”
“Estava aqui a pensar que é melhor não moer as vossas cabeças com explicações complexas e das quais eu não estou absolutamente certo. E não é importante, há outras peças deste puzzle bem mais importantes.”
“Não é importante? Não sei se estou de acordo contigo; afinal, a curva da velocidade de rotação das galáxias ainda será a mais clara evidência da Matéria Negra. Se te gabas de não precisar da Matéria Negra, tens de explicar porque é que a velocidade de rotação das galáxias não diminui com o afastamento ao centro, como é próprio dos sistemas gravitacionalmente ligados.”
“O que é que estás para aí a dizer, Mário?”
“No sistema solar, por exemplo, os planetas mais distantes do Sol têm velocidades menores que os mais próximos. Isto tem de ser assim porque é o campo gravítico que causa a trajectória curva do planeta; ora o campo diminui com o quadrado da distância enquanto a força necessária à trajectória orbital, se a velocidade do planeta não variar, apenas diminui com a distância; então, a velocidade dos planetas têm de diminuir também com a distância ao Sol para que a aceleração centrípeta da sua trajectória diminua com o quadrado da distância, tal como o campo gravítico, percebeste?”
“Querias? Isso assim é confuso para mim, preciso de escrever as fórmulas da aceleração centrípeta e do campo gravítico; mas acredito em ti, portanto podes passar adiante.” Luísa ri-se com frescura.
“Ora nas galáxias espirais a velocidade de rotação não segue a lei de diminuição prevista, é quase constante; para explicar isto é preciso considerar a existência de uma matéria invisível que crie um campo gravítico adicional capaz de manter a velocidade de rotação constante.”
“Ahh, é então aí que entra a matéria negra... mas espera lá, agora pergunto eu, porque é que a matéria negra haveria de ser na quantidade certa para manter constante a velocidade de rotação? Numas galáxias ela poderia diminuir com a distância ao centro, noutras aumentar... é assim?”
“Bem, não, em todas as galáxias analisadas, tanto quanto sei, a velocidade de rotação segue aproximadamente o mesmo padrão, torna-se independente da distância...” Luísa ri-se, como quem diz «grande explicação essa», o Mário enrubesce e dispara:
“Luísa, isto não tem contestação: a trajectória da matéria revela o campo gravítico e o campo gravítico das galáxias não diminui com o quadrado da distância ao centro; logo, existe uma fonte adicional de campo. Como não se observa nenhuma fonte, ela é invisível aos nossos meios de observação. Mas tem de estar lá. E tu, em vez de risinhos, só tens é de apresentares uma explicação melhor...”
A Luísa, muito rápida:
“Eu não, mas o Jorge certamente que tem uma...”
Respiro fundo. O Mário tem razão, esta peça do puzzle é incontornável.
“Então cá vai.”
Galaxy rotation curve for the Milky Way. Vertical axis is speed of rotation about the galactic center. Horizontal axis is distance from the galactic center in kpcs. The sun is marked with a yellow ball. The observed curve of speed of rotation is blue. The predicted curve based upon stellar mass and gas in the Milky Way is red. Scatter in observations roughly indicated by gray bars. The difference is due to dark matter or perhaps a modification of the law of gravity.[41][42][43]
Terça-feira, 2 de Junho de 2009
“Recapitulando: vimos que a distribuição inicial de partículas, misteriosamente certinha, se rompe em bolhas, que crescem, varrendo a matéria para a casca da bolha. Possivelmente pensarão que essas cascas serão distribuições uniformes de matéria, de moléculas de Hidrogénio, assim uma espécie de bolas de sabão, não é verdade?”
“E não são?”
“Não, a partir de certa altura deixam de o ser.” Faço uma pausa, isto é um pouco delicado. Penso um pouco, respeitam a minha concentração.
“De certa forma, poderíamos dizer que o Universo tem horror à uniformidade. A uniformidade inicial explodiu em bolhas, a uniformidade das cascas também não será excepção, não vos parece?”
“O quê, também rebentam bolhas na casca da bolha? As bolhas sofrem de acne juvenil?” O riso franco e solto da Luísa ilumina a sala.
“Ah ah, de certa maneira Luísa, pois agora o Universo, de criança inocente transformou-se em adolescente complexo e de comportamentos mais difíceis de explicar” Bem, não quis ficar atrás da Luísa a fazer humor, mas sinto que não me saí muito bem... adiante:
“Notem que para percebermos o que vai acontecer na casca não podemos fazer analogias com o que conhecemos; isso porque a densidade de partículas na casca, apesar de milhões de vezes superior à inicial, continua a ser ínfima, milhares de vezes inferior à do vácuo máximo que se consegue em laboratório, mesmo com recurso a câmaras criogénicas.”
“Ou seja, não podemos tratar a casca como se fosse um gás... e massas de Jeans e coisas do tipo não se aplicam...”
“Certo Mário. Aqui, os choques entre partículas não são relevantes, não determinam os fenómenos. As flutuações de densidades não são contrariadas por processos de difusão resultantes desses choques.”
“Está bem, mas mesmo assim as flutuações de densidade relevantes serão raras, a avaliar pelo que sucede no estado inicial e os 100 milhões de anos-luz de distância média entre bolhas... “
“Ah, mas agora é diferente! Não te esqueças que a densidade da casca é milhões de vezes maior que a inicial; isso significa que a escala dos acontecimentos, que é função do número de partículas, varia com a distância entre as partículas, ou seja, com a raiz cúbica da variação de densidade.”
“Espera lá, explica lá isso outra vez, como se eu fosse assim muito burra, estás a ver?” Não aguentamos o riso com a pantomina da Luísa.
“A distância entre as partículas na casca”, ainda com o riso a escapar-me, “ será umas centenas de vezes menor que inicialmente, pois a densidade varia com o cubo da distância entre partículas.”
“Ah, agora percebi! A raiz cúbica de um milhão é cem! Então... a distância entre as borbulhas na casca será... de um milhão de anos-luz.”
“Por aí, por essa ordem de grandeza. A densidade na casca não é uniforme, varia radialmente. Mas não concluas já que vamos ter «borbulhas» na casca, porque agora o cenário é diferente e coisas diferentes se vão passar.”
“Diferente? Então não é só a densidade que é diferente?”
“Na casca os fenómenos vão ser a duas dimensões e não a três, porque a casca é muito mais fina do que as estruturas que nela se vão desenvolver. Os campos vão ser diferentes e temos de os analisar para perceber o que vai suceder.”
“Bolas, que nunca mais chegamos ao fim!”
“Impaciente Luísa! Se fosse trivial também os astrónomos já teriam percebido como era, não te parece? Queres saber mais do que os astrónomos sem um esforçozinho?” Pois, fui um pouco mauzinho com a Luísa, mas é preciso espicaçar o seu brio, que é muito, antes que se lhe acabe a paciência.”
“Vá lá vá lá, deixa-te de desconversas e anda para a frente.”
Resultou.